A origem do estilo Gōjū-ryū de Karate-dō

A arte marcial que conhecemos hoje como Karate-dō teve a sua origem em Okinawa, ilha principal do antigo arquipélago de Ryūkyū. E, antes de chegar no Japão no século XX e ser batizada com esse nome, era chamada de Tōde (mãos da China). A origem desta arte marcial está atrelada principalmente à influência chinesa ao antigo Reino de Ryūkyū, onde, entre outros fatores, ocorreram diversas trocas de conhecimentos entre antigos mestres chineses de Kempo (chuan-fa) e habitantes do reino (BERNARDES).

Com a chegada e posterior desenvolvimento do Karate-dō de Okinawa no Japão continental, os estilos (ryū = escola, sistema ou estilo) começaram a ser fundados e registrados junto ao Dai Nippon Butokukai — instituição que tinha o objetivo de solidificar, promover e padronizar as disciplinas e sistemas marciais existentes no Japão (SANCHES) —, preservando diferentes linhagens de karate. O Gōjū-ryū foi um desses estilos, fundado pelo mestre Chōjun Miyagi, um dos alunos do antigo e famoso mestre de Tōde: Kanryō Higaonna.

Kanryō Higaonna

Juntamente de Ankō Azato e Ankō Itosu, Kanryō Higaonna foi um dos 3 mestres fundamentais na ligação entre o passado e os novos tempos do Tōde. Higaonna nasceu em 1.853, na vila de Nishimura em Okinawa. Pertencia à antiga nobreza da ilha, mas com a perda de títulos de classe, sua família passou a viver do comércio de lenha entre as ilhas Kerama e Okinawa (SANCHES).

Iniciou no Tōde por volta de seus 14 anos, como aluno de Seishō Tsuji Aragaki (com quem estudou por 3 anos) e também com Taitei Kojō. Mas o período mais notável de seu treinamento foi com o mestre chinês do estilo Bái Hè Quán (Garça Branca) de Kempo (chuan-fa) Ryū Ryū Kō, a partir de 1.887, na cidade de Fúzhōu na China. Com o mestre Ryū Ryū Kō, Higaonna passou 13 anos de intenso treinamento (SANCHES).

Quando voltou para Okinawa, Higaonna passou a ministrar aulas — ficando famoso pelo rigor de seus treinamentos e pelos golpes poderosos de suas pernas —, treinando alguns dos mestre mais relevantes para a modernização do Tōde (e, consequentemente, no karate), tais como Kenwa Mabuni (Shitō-ryū) e Chōjun Miyagi. Sendo este último, além de futuro fundador do estilo gōjū-ryū de karate-dō, um de seus alunos de maior destaque e proximidade com o mestre, inclusive estando ao seu lado no leito de morte (SANCHES).

Chōjun Miyagi

Nascido em 25 de abril de 1888 na Vila de Higashi-machi em Naha (Okinawa), Chōjun Miyagi era filho de uma família aristocrata que possuía um negócio de importação e exportação, com dois navios, que faziam viagens regulares à China (SANCHES).

Iniciou seus treinamentos no Tōde com cerca de 11 anos, aprendendo inicialmente com Ryukō Aragaki por 2 anos, antes de ser apresentado e começar a treinar integralmente com Kanryō Higaonna (SANCHES).

Após a morte de Higaonna em 1.915, Miyagi seguiu os passos de seu mestre e viajou para a China com o intuito de encontrar e treinar com Ryū Ryū Kō. Infelizmente, naquele mesmo ano, Ryū Ryū Kō havia morrido. Contudo, Miyagi ficou 2 meses na China e estudou alguns dos estilos locais de Kempo chinês (SANCHES).

Ao voltar para Okinawa, passou a ministrar aulas de Tōde no quintal de sua casa. Neste período, Miyagi conheceu um chinês comerciante de chá chamado Go Kenki — praticante de um estilo de Kempo chinês conhecido como Boxe da Garça Branca — e outro chinês, amigo deste comerciante, chamado Tō Daiki — praticante do Boxe do Punho do Tigre. Miyagi acabou treinando com ambos, tornando-se muito próximo de Go Kenki. Na década de 1.920, Go Kenki e Miyagi viajaram para a China, com o intuito de estudar outros estilos de Kempo chinês. Desta viagem se originaria o Kata Tenshō (mãos que giram), presente no Gōjū-ryū (SANCHES).

Além do Tōde aprendido em Okinawa, os estudos de diversas artes marciais chinesas foram fundamentais para lapidar o estilo de Karate-dō que seria fundado por Chōjun Miyagi.

A origem do nome Gōjū-ryū

A partir dos anos de 1.920 ocorreram apresentações de Tōde (significativas para a transformação para o Karate-dō) para autoridades japonesas em Okinawa e, até mesmo, no Japão continental. E, em uma dessas apresentações, mais especificamente em 1.927 na cidade de Quioto no Japão, um dos principais alunos de Miyagi naquele período, Jin’an Shinzato, representou o Tōde de seu mestre (que não pode comparecer devido a outro compromisso). Na ocasião, durante o registro para o evento, lhe foi perguntado o nome de seu estilo de Tōde, respondendo
“estilo meio rígido”.

Retornando a Okinawa, Shinzato explicou o que aconteceu a seu sensei, que após reflexão achou necessário dar um nome a arte que ensinava. Então, baseando-se na terceira das “oito leis do punho” existentes no livro “Bubishi”, decide dar o nome de Gōjū-ryū, “Estilo Rígido e Suave”. Após a escolha do nome, Miyagi o registra na “Dai Nippon Butokukai”, em 1930, sendo aceito o nome em 1933, assim tornando-se o primeiro mestre a dar nome a um estilo de Karate e o Gōjū-ryū sendo primeiro estilo a ter nome entre as escolas de Karate-dō (BERNARDES).

O Karate Gōjū-ryū

O estilo Gōjū-ryū de Karate-dō é caracterizado por possuir movimentos circulares — contrastando com a predominância de movimentos lineares de outros estilos —, busca do combate à curta distância (e progressão para as costas do adversário) e posturas com centro de gravidade baixo, tais como a sanchin dachi, neko ashi dachi e shiko dachi. Além disso, a respiração sonora como, por exemplo, utilizada no kata sanchin também é marcante no estilo. Os chutes são baixos e visam, especialmente, o joelho (ex.: kansetsu-geri). Também possui o trabalho de condicionamento físico, chamado de hojo-undō, com equipamentos tradicionais (chi ishi, makiage kigu, makiwara…).

Atualmente, devido a ascensão do karate como esporte e, pelo Gōjū-ryū ser um dos estilos reconhecidos pela Federeção Mundial de Karate (WKF), muitas escolas também incorporaram os treinos voltados para o shiai kumite (luta de competição), dando enfoque no combate de longa e média distância (além da curta), chutes altos e outras técnicas voltadas especificamente para as regras de competição.

É comum no karate também encontrar, dentro do mesmo estilo, linhas de escolas específicas (muitas vezes fundadas por alunos seniores dos antigos mestres) com suas particularidades. E, com o Gōjū-ryū, não é diferente. Entre essas linhas/escolas de Karate-dō Gōjū-ryū podem ser citadas:

• Jundōkan;
• Meibukan;
• International Karatedo Gojukai Association (IKGA);
• Seiwakai.

A nossa escola faz parte da Okinawa Goju-ryu Karatedo Kyokai (OGKK), uma associação fundada por Eiichi Miyazato — fundador da escola Jundōkan e que foi um dos alunos seniores de Chōjun Miyagi — e Koshin Iha — que treinou aos 14 anos com Chōjun Miyagi e, após a morte do mestre, seguiu com Eiichi Miyazato — e Japan Karate Federation Goju-kai (JKF Goju-kai).

Além da preservação dos elementos tradicionais do Gōjū-ryū, a nossa escola também incorpora nas nossas rotinas os treinamentos específicos para competições.

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Referências

• BERNARDES, Guilherme Pierozan. Viagens de karatecas do rio grande do sul para o japão (anos 1990): ressonâncias na prática do karate no estado. 2019. Trabalho de conclusão de curso – Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, UFRGS, 2019;
• SANCHES, Eros José. Ikken Hissatsu – As Origens do Karate-Do. Primeira Edição. Porto União – Santa Catarina. Gráfica e Editora Kaygangue Ltda. 2021;
• OGKK. History. Disponível em https://ogkk.jp/history_en.html. Acesso em 31 de Maio de 2022.
• Wikipédia. Goju-ryu. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Goju-ryu. Acesso em: 29 de Maio de 2022.